sábado, 25 de agosto de 2018

'Rei dos Ônibus' e ex-Fetranspor dizem que 'caixinha' para políticos do RJ arrecadava até R$ 6 milhões por mês


Jacob Barata Filho e Lélis Teixeira disseram que Jorge Picciani recebeu pagamentos por mais de 5 anos; defesa do presidente afastado da Alerj nega. Esquema começou há 20 anos, segundo os réus.

Empresário de ônibus do RJ admite caixa dois para distribuir entre políticos

Em depoimento ao juiz Marcelo Bretas, o empresário Jacob Barata Filho, conhecido como "Rei dos Ônibus", e Lélis Teixeira, ex-presidente da Federação das Empresas (Fetranspor), admitiram a existência do que os procuradores da Lava Jato chamam de "Caixinha da Fetranspor", que arrecadaria até R$ 6 milhões por mês para pagar vantagens indevidas a políticos.

O esquema começou há 20 anos e, segundo os réus, beneficiou o presidente afastado da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Jorge Picciani, que teria recebido da caixinha por cinco anos. Defesa do deputado afirma que depoimento de Barata Filho "levanta apenas conjecturas" (leia íntegra abaixo).

Réus na Operação Cadeia Velha, desdobramento da Lava Jato, Barata Filho e Lélis depõem a Bretas na tarde desta sexta-feira (24). Também é ouvido um dos filhos de Picciani, Felipe.

"Havia um acordo de pagamento para o deputado Jorge Picciani. O objetivo exatamente, a forma de pagamento, eu não sei precisar. Mas realmente o Jorge Picciani, como presidente da Alerj, teria que ter essa contribuição porque os projetos todos passam pela Assembleia", afirmou.

"O deputado Jorge Picciani foi presidente da Assembleia por vários mandatos e, como presidente, era uma pessoa-chave para proteção (do setor) do transporte e pudesse evoluir em projetos que fossem para o benefício de todos."
Lélis Teixeira (à direita) chega para audiência na Justiça Federal do Rio (Foto: Reprodução/GloboNews)

Ele disse que, inicialmente, o que chama de "contribuição" era doação de campanha.

"Realmente existia um caixa gerado pela Fetranspor para pagamentos a agentes públicos no sentido de tentar melhorar o sistema de transporte."

"O objetivo da geração desse caixa dois era contribuir com agentes públicos para atingir esse objetivo [de não criar problemas para as empresas de ônibus]", prosseguiu.

Lélis Teixeira também confirmou, pela primeira vez, a existência da caixinha da Fetranspor, mas disse que não participava das negociações. Ex-presidente, ele disse que era técnico, mas soube da existência de vantagens indevidas por Jorge Picciani e Paulo Melo.

Lélis garantiu também que Edson Albertassi recebeu as vantagens através de rádios de sua família no interior, inclusive por ser presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Alerj.

Tanto esta comissão quanto a de Transportes, segundo ele, eram importantes para a Fetranspor ter "boas relações".

Filho de Picciani depõe

Acusado de intermediar o recebimento de propina para seu pai, Felipe Picciani negou qualquer crime. Ele se defendeu, dizendo ser um zootecnista que não trabalhava na área administrativa da Agrobilara, empresa de gado da família Picciani.

A citação foi feita por Jonas Lopes, ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado (TCE), que delatou a lavagem de dinheiro por meio da empresa. Felipe está preso há cerca de 10 meses e relatou a conversa que teve com o pai, antes de Jorge Picciani ser transferido para prisão domiciliar.

"'Pai, como é que o cara fala um negócio dele?' E ele respondeu: 'A gente não sabe o que passa no coração de cada um, o aperto de cada um'".
O empresário Jacob Barata, o 'Rei dos Ônibus', foi preso duranta a operação Cadeia Velha, desdobramento da Lava Jato (Foto: Rodrigo Chadí/Fotoarena/Estadão Conteúdo)

RioCard

O 'Rei dos Ônibus do Rio' afirmou que o fluxo de caixa dois se aprofundou na última década com a bilhetagem eletrônica. Isso porque a empresa que administra o maquinário cobrava 3,5% dos valores das passagens para a manutenção do sistema, mas 1% deles era trocado por dinheiro em espécie e redistribuído para políticos.

O que dizem os citados

Em nota, a defesa de Picciani afirma: "O parlamentar esclarece que o depoimento do empresário levanta apenas conjecturas, uma vez que ele diz que seria outra pessoa que faria os pagamentos e não informou que tipo de ajuda o deputado teria dado a ele e ao setor. É mais uma declaração confusa de alguém que quer fazer delação sem provas. Quando a defesa do deputado perguntou diretamente ao depoente se os recursos que diz ter dado eram referentes a propina ou caixa dois, o juiz Bretas não permitiu que respondesse, para espanto dos advogados."

A defesa de Edson Albertassi enviou a seguinte nota: "Os contratos da Fetranspor com as rádios da família de Albertassi seguiram os padrões e tabelas comerciais para veiculaçâo de publicidade na região. Todas as inserções contratadas foram veiculadas. Toda a documentação relacionada ao assunto já foi apresentada à Justiça".

A defesa de Paulo Melo optou em não se pronunciar.

'Cadeia Velha'

A Cadeia Velha apura o uso da presidência da Alerj para a prática de corrupção, associação criminosa, lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Nela, foram presos os dois últimos presidentes da Casa: Jorge Picciani e Paulo Melo, do MDB.

Além deles, Edson Albertassi, outro político da sigla que seria nomeado conselheiro do TCE para a manutenção do esquema criminoso, de acordo com os procuradores. A organização, segundo o Ministério Público Federal, atua desde o início da década de 1990.

Jacob Barata Filho foi preso duas vezes, mas foi solto por determinação do ministro do STF Gilmar Mendes. Na época, o Ministério Público Federal pediu a suspeição de Mendes já que a filha de Barata é casada com um sobrinho do ministro. Gilmar foi o padrinho de casamento.

Por Gabriel Barreira, G1 Rio

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